Enquanto espero meu café, sentada na mesinha do lado de fora, observo as pessoas ao meu redor. Confesso que é a primeira vez que paro pra olhar o que acontece em minha volta. Devo isso ao fato de a bateria do meu celular ter acabado há alguns segundos. Olho para a mesa à minha frente. Sem nem mesmo perceber, já saquei o carregador portátil e pluguei meu celular à ele.
É como se me faltasse o oxigênio se aquilo não fosse feito imediatamente. Respiro fundo, garantindo que não é dali que vem meu oxigênio precioso e penso por um momento no quão materialista minha reação foi. Mas, antes de começar a ter uma crise existencial bem ali na mesinha do café gourmet onde sempre paro antes de ir trabalhar, uma coisa me chamou a atenção e me fez esquecer do que eu estava pensando.
Uma senhora que aparentava já ter vivido uns bons anos – não me atrevi a adivinhar quantos – se divertia como uma criança em meio as pombas que voavam pra lá e pra cá. Ela carregava um pacotinho de farelo. De vez em quando, enfiava a mão lá dentro e jogava os flocos branquinhos pelo ar, enquanto as pombas batiam suas asas e também pareciam se divertir da mesma forma. Era uma cena tão ingênua e ao mesmo tempo tão rara de se ver. Talvez nem tão rara assim, o problema é que nós esquecemos de olhar.
Quando a garçonete me entregou o cafezinho e o mini-bolo que eu tinha pedido, reparei que eu sorria como uma boba ao olhar aquela cena. Agradeci e ajeitei a xícara e o pratinho na mesa, junto com meu celular e o carregador. Ela disse, em solidariedade ao meu sorriso ‘Ela traz comida todos os dias aos pombos. É uma fofa, não é?’. Antes mesmo que eu pudesse responder, a garçonete já tinha seguido sem caminho até o interior do café. Ela fazia aquilo todos os dias; eu me sentava naquele café todos os dias, mesmo assim, nunca tinha reparado aquela cena. Tentei culpar meu celular e meu horário sempre corrido, mas ele nem estava ligado para ouvir meus desaforos.
Era a mim mesma que devia explicações. Guardei meu celular e seu carregador na bolsa e decidi me dedicar ao que acontecia em volta – pelo menos enquanto tomava meu café. Comecei a fazê-lo todos os dias. Primeiro, na hora do café. Depois, a qualquer hora em que meu celular fosse completamente dispensável. Fiquei surpresa em descobrir que ele é quase sempre dispensável. Talvez da mesma forma que me surpreendi quando descobri que por aquela pequena telinha podia conhecer o mundo inteiro.
Vi tanta coisa diferente e tanta coisa que me remeteu à minha infância. Você sabia que, de vez em quando, ainda há uma pipa no céu? Ainda há alguém no chão, puxando a linha e fazendo ela voar? Às vezes, um passarinho pousa bem perto da gente e parece querer puxar papo. Existem coisas incríveis que acontecem além da tela do celular. Coisas que acontecem além das paredes da nossa casa.
Existem sons, cheiros e luzes que só são sentidas se a gente desligar tudo da energia. Existem coisas maravilhosas acontecendo a poucos metros de distância, e a gente só se concentra em olhar pra uma telinha que fica entre nós e o resto do mundo. Se desliga um pouco e olha em volta. O grande espetáculo da vida tá acontecendo logo ali, a gente só esquece de olhar.
Colaboradora: Maju Sanoli